Starlink é “presente de grego”?
Com mais de 400 satélites no ar – e uma autorização para colocar 42 mil deles em órbita – a SpaceX pode acabar dificultando o trabalho de observatórios e pesquisadores.
A SpaceX lançou em maio de 2019 primeiros satélites que farão parte de uma frota de milhares de satélites na órbita da Terra para fornecer internet a qualquer região do mundo. E, de acordo com o CEO Elon Musk, este projeto, chamado Starlink, é fundamental para o financiamento da SpaceX no que diz respeito à exploração de Marte.
Musk declarou que a Starlink servirá como principal gerador de dinheiro para a SpaceX, ainda que tenha feito questão de ressaltar que sua empresa espacial tem o capital necessário para completar a primeira e mais importante fase do projeto de satélites de internet.
A Starlink visa criar uma rede interconectada de satélites na baixa órbita da Terra, o que vem sendo chamado de “constelação de satélites”, capaz de transmitir internet de alta velocidade a qualquer lugar do planeta. A ideia é lançar 11.943 satélites para tal.
Nas palavras de Musk, “vemos isso [a Starlink] como uma maneira de a SpaceX gerar receita que pode ser usada para desenvolver foguetes e naves espaciais cada vez mais avançadas; acreditamos que podemos usar a receita da Starlink para financiar o Starship”. Starship é o nome do enorme foguete reutilizável que a empresa vem testando nos últimos meses, que será capaz de lançar naves para outros mundos — como Marte. Tal foguete será capaz de transportar até 100 pessoas de uma só vez para a Lua ou ao Planeta Vermelho.
Em fevereiro de 2018, a SpaceX lançou dois satélites de teste do projeto Starlink, e desde então vinha conseguindo financiamentos e buscando aprovação de órgãos oficiais do governo dos Estados Unidos para iniciar a frota real de satélites do projeto — o que aconteceu em 2019. Musk diz que a empresa precisará de mais seis lançamentos, com 60 satélites por voo, para conseguir uma cobertura mínima, iniciando então a primeira fase de operação da Starlink. Com 720 satélites em órbita (em uma dúzia de lançamentos), a cobertura seria considerada “moderada”.
Musk também explicou que cada satélite tem “cerca de um terço de conectividade útil” e, para evitar colisões no espaço, eles “vão manobrar automaticamente em torno de qualquer detrito orbital”. O CEO prevê que, se a empresa conseguir manter o cronograma de lançamentos, ela terá a maioria dos satélites em órbita ao redor da Terra dentro de dois anos.
Satélites da Starlink podem prejudicar observações astronômicas
Quando a SpaceX montou seu projeto Starlink, para colocar uma constelação com milhares de satélites em órbita da Terra, não avaliou corretamente o impacto que isso teria na observação do céu noturno. Agora, com 422 satélites no ar, e outros tantos ainda a serem lançados, cientistas e a própria empresa buscam soluções que reduzam prejuízo causado nas pesquisas astronômicas.
O problema é de poluição visual: cada satélite reflete a luz do Sol, tornando-os brilhantes o suficiente para interferirem no céu noturno. Imagine então 42 mil deles, como é o plano da SpaceX. “Seria uma mudança fundamental em nossa experiência humana à noite”, avalia o astrônomo Tyler Nordgren, em entrevista ao New York Times.
Há um esforço para escurecer os satélites desde o início de janeiro. De acordo com o CEO da SpaceX, Elon Musk, o ângulo dos painéis solares dos satélites foi mudado, aproximando-os da Terra para que reflitam menos luz. A empresa também fará a instalação de uma proteção em todos os dispositivos a partir do nono lançamento da missão. Esses materiais serão confeccionados com base em uma espuma escura especial extremamente transparente para ondas de radiação.
Para Patrick Seitzer, professor de astronomia emérito da Universidade de Michigan, as mudanças tornarão os satélites invisíveis a olho nu. Isso já é grande alívio para os astrônomos e defensores do céu noturno, que inicialmente se preocupavam com o fato de as luzes em movimento dos objetos dificultarem a detecção de constelações.
Mas os temores dos pesquisadores vão além, e dizem respeito também ao futuro da pesquisa astronômica avançada. Não se sabe ao certo, por exemplo, se o Starlink irá interferir na visão de observatórios como o Vera C. Rubin, um telescópio norte-americano instalado no Chile que varrerá o céu inteiro a cada três noites a partir de 2023. Essas informações serão enviadas a todos os principais observatórios terrestres e espaciais, para que possam acompanhar as descobertas o mais rápido possível.
Um satélite brilhante o suficiente no céu pode criar impressões fantasmas ou causar outros efeitos no detector do telescópio. Para contornar esses problemas, pesquisadores do observatório Rubin e da Universidade da Califórnia criaram um extenso algoritmo que “limpa” as imagens, mas ele só funciona para satélites fracamente iluminados.
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