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Breakthrough! Físico brasileiro usa microrrobôs para erradicação de biofilmes

Prof. Amauri Jardim de Paula, do Departamento de Física da Universidade Federal do Ceará, é um dos autores principais de uma pesquisa que pode representar grande avanço para a ciência, publicada nesta quarta-feira (24/04/2019) em um periódico de grande prestígio no mundo, a revista Science Robotics.


Prof. Amauri Jardim, do Departamento de Física, é um dos autores principais da pesquisa (Foto: Ribamar Neto/UFC)

O artigo descreve um método revolucionário que utiliza nano e microrrobôs (assista ao vídeo abaixo) para erradicar biofilmes ‒ comunidades bacterianas que se associam a superfícies e são incrivelmente difíceis de tratar e remover, resultando em mortes e danos na área de saúde e em grandes prejuízos na indústria. Trata-se de mais um exemplo do alto grau de impacto das pesquisas desenvolvidas na UFC, conforme constatado recentemente em ranking internacional.

A pesquisa, considerada na linguagem científica como breakthrough (de descoberta, grande inovação, em inglês), foi feita em parceria com pesquisadores da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos.

O pesquisador explica que os biofilmes se formam em superfícies abióticas ‒ como implantes ósseos, odontológicos, catéteres e sondas hospitalares ‒, bem como em superfícies bióticas, como dentes e mucosas, muitas vezes em espaços de difícil acesso para os instrumentos médicos atualmente disponíveis. Na área da saúde, após formados, os biofilmes produzem efeitos devastadores, incluindo infecções persistentes e várias complicações médicas.

Estima-se que nos Estados Unidos 1,7 milhão de pessoas adquirem infecções hospitalares desse tipo por ano, com alto índice de mortalidade (um para cada 17 casos). Em números gerais, estudos mostram que 7% dos pacientes internados em hospitais podem vir a desenvolver uma infecção por biofilme. Em países pobres, esse número sobe para 10%.

No contexto industrial, biofilmes entopem linhas de água, válvulas, filtros, tubulações e fendas, causando prejuízos anuais de bilhões de dólares na indústria marítima, em plantas de dessalinização, e na indústria química em geral.

DESAFIO ‒ Um dos fatores que contribuem para a grande resistência dos biofilmes é a existência de uma camada de materiais, chamados exopolissacarídeos (EPS), que circunda as células bacterianas, conferindo coesão à estrutura do biofilme. Fazendo uma analogia, o Prof. Amauri explica que os EPS representam tijolos de construção, os quais se alojam e dão resistência química e mecânica às bactérias.


Robôs CARs, moldados em formato de broca dupla hélice, fazendo a limpeza no canal de um dente (Imagem: Autores da pesquisa)

Além disso, esse “tijolos” também atuam como barreiras contra os medicamentos antibacterianos (antibióticos), impedindo que as bactérias sejam mortas. “Dessa forma, em função da existência dos EPS, a erradicação completa dos biofilmes representa um enorme desafio tecnológico”, salienta o pesquisador.

INOVAÇÃO ‒ Com a miniaturização de sistemas (sobretudo a nanotecnologia), os robôs têm ficado cada vez menores e com movimentos mais precisos. Na pesquisa em questão, os pesquisadores desenvolveram robôs antimicrobianos catalíticos (CARs), capazes de realizar múltiplas tarefas que resultam na eliminação completa de biofilmes.

Primeiramente, os CARs matam quimicamente as bactérias e degradam a matriz de EPS do biofilme. Na sequência, o controle de movimento dos CARs (feito através de campo magnético) permite que se colete e elimine os resíduos do biofilme. Moléculas reativas, geradas a partir de nanopartículas de óxido de ferro presentes nos CARs, se mostraram capazes de matar as bactérias com alta eficiência, e também destruir a matriz de EPS.

No artigo, foi explorada uma técnica de modelagem para fabricar robôs magnéticos em 3-D personalizados de pequena escala. “Produzimos robôs em duas formas: CARs duplos helicoidais, formados a partir de duas hélices enroladas em torno de um eixo central, e CARs do tipo palhetas, com estruturas semelhantes a barbatanas em torno de um núcleo central. A primeira forma foi inspirada na eficácia de propulsão das hélices helicoidais, que podem penetrar nas barreiras físicas, enquanto a última forma foi motivada pelo sucesso das ferramentas em forma de palhetas na ruptura dos biofilmes”, descreve Amauri.

Segundo o docente, “os próximos passos da pesquisa envolvem dar funções mais específicas aos robôs, produzindo-os com outros formatos ‒ como brocas, cones, entre outros ‒ e também partir para testes in vivo”.

DEMONSTRAÇÃO ‒ Para ilustrar a possibilidade de aplicações práticas, os pesquisadores demonstraram o uso potencial de CARs para acessar o interior de dentes humanos. Eles utilizaram a técnica em uma das áreas anatômicas mais desafiadoras dos dentes, denominada istmo ‒ uma lacuna bastante estreita entre os canais onde o biofilme bacteriano geralmente se forma no interior dos dentes.


Robôs CARs, usados como uma dispersão, fazendo a limpeza de uma superfície em trajetórias precisas e bem definidas (Imagem: Autores da pesquisa)

Primeiro, os CARs atravessaram prontamente o istmo em um movimento para frente e para trás, conforme indicado pelo campo magnético externo. Em seguida, foi feito o rompimento de biofilmes no istmo.

Mostrou-se também a atuação dos CARs através do canal do dente, outro local comum de formação de biofilme dental. Juntos, esses exemplos ilustram a viabilidade e possíveis aplicações de movimento controlado e formas especializadas para acessar, mover e direcionar biofilmes prejudiciais.

“Com esses princípios, criamos uma plataforma robótica de pequena escala que incorpora nanopartículas de óxido de ferro para matar biofilmes e extraí-los de superfícies ou de espaços confinados de difícil acesso. Os robôs percorrem caminhos específicos para derrubar e remover de forma precisa e controlável as bactérias e os resíduos de biofilme. A incorporação da modalidade de degradação catalítica que atua em conjunto com as propriedades magnéticas introduz uma nova estrutura conceitual para uma plataforma robótica para erradicar os biofilmes”, resume o Prof. Amauri.

Fonte: Portal da UFC

Cristiane Tavolaro

Sou física, professora e pesquisadora do departamento de física da PUC-SP. Trabalho com Ensino de Física, atuando principalmente em ensino de física moderna, ótica física, acústica e novas tecnologias para o ensino de física. Sou membro fundadora do GoPEF - Grupo de Pesquisa em Ensino de Física da PUC-SP e co-autora do livro paradidático Física Moderna Experimental, editado pela Manole.

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