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Impressão em 3D feita diretamente dentro do corpo humano poderia curar úlceras estomacais

Técnica de bioimpressão in vivo feita com microrrobôs também ajudar a reparar hérnias e tratar infertilidade

Úlceras estomacais e outras feridas gástricas atingem uma em oito pessoas pelo mundo, mas terapias convencionais tem suas falhas. Agora, os cientistas visam tratar tais problemas explorando uma nova fronteira na impressão 3D: depositar células vivas diretamente dentro do corpo humano.

Assim como impressoras 3D produzem camadas de material para criar estruturas, bio-impressoras extraem células vivas para produzir tecidos e órgãos. Um sonho distante desse conceito é de que as pessoas em listas de espera para doações de órgão — aproximadamente 70,000 apenas nos EUA, de acordo com a organização sem fins-lucrativos United Network for Organ Sharing — pode, um dia, ter a opção de conseguir um órgão bio-impresso. Ainda que provavelmente ainda leve anos para adquirirmos a  habilidade de produzir um coração funcional ou rim dessa forma, objetivos realistas mais próximos incluem estruturas mais simples, como enxertos ósseos. Tecidos vivos impressos fora do corpo, entretanto, ainda precisariam de uma cirurgia de implantação, que geralmente envolve incisões grandes que aumentam o risco de uma infecção e atrasa o período de recuperação.

  Mas, e se os médicos pudessem imprimir as células diretamente dentro do corpo? A ideia seria utilizar técnicas cirúrgicas atualmente minimamente invasivas para inserir ferramentas 3D nos pacientes através de pequenas incisões, e então produzir novos tecidos. Aplicações potenciais para tal “impressão in vivo” podem incluir malhas cirúrgicas para ajudar a reparar hérnias e curativos para ovários, para ajudar a reverter a infertilidade.

A maior parte das pesquisas anteriores sobre bio-impressões in vivo focaram  tratamentos de pele e outros tecidos na parte externa do corpo, porque o equipamento necessário é geralmente grande demais para acessar o trato digestivo e outros órgãos centralizados sem uma cirurgia grande. Em seus esforços para tratar lesões no estômago de maneira menos invasiva, os cientistas na China queriam desenvolver um robô bio-impressor em miniatura que poderia entrar no corpo humano com relativa facilidade. Os pesquisadores utilizaram técnicas existentes para criar aparelhos eletrônicos habilidosos, como abelhas mecânicas e robôs inspirados em baratas, diz o autor sênior do estudo Tao Xu, bioengenheiro na Universidade de Tsinghua, em Pequim.

O microrrobô resultante tem apenas 30 milímetros de largura— menos da metade da largura de um cartão de crédito — e pode se dobrar para um comprimento de 43 milímetros. Uma vez dentro do corpo do paciente, ele se desdobra e fica com 59 milímetros de comprimento e pode começar a sua bio-impressão. “A equipe construiu mecanismos inteligentes que tornam o sistema compacto quando entra no corpo, mas pronto para fornecer uma área de trabalho grande uma vez que passa as construções apertadas da entrada”, diz David Hoelzle, engenheiro mecânico na Universidade do Estado de Ohio, que não participou do estudo.

Em seus experimentos, os pesquisadores na China colocaram o microrrobô dentro de um endoscópio (um tubo longo que pode ser inserido através de aberturas corporais) e, com sucesso, o implantaram através de um cano curvado em um modelo transparente de plástico de um estômago. Lá, eles utilizaram ele para imprimir géis carregados de resina celular e células dos músculos do estômago (que foram criadas em cultura por um laboratório comercial) em uma placa de petri. As células impressas permanecerem viáveis e se proliferaram firmemente ao longo do curso de 10 dias. “Esse estudo é a primeira tentativa de combinar microrrobôs e bio-impressões em conjunto”, Xu diz.

Os pesquisadores dizem que o tratamento clássico para lesões gástricas incluem medicações, que podem funcionar lentamente e nem sempre são efetivas; cirurgias endoscópicas, que cuidam apenas de feridas relativamente pequenas; e sprays entregues por meio de endoscopia, que interrompem  o sangramento mas não ajudam muito no processo de cicatrização de um ferimento  maior. A expectativa é que  a bio-impressão in vivo é possa por fim  aperfeiçoar esses métodos, ao depositar  curativos sobre lesões gástricas com estruturas vivas capazes de repará-las, diz Xu.

Novas pesquisas poderiam diminuir o microrrobô para 12 milímetros de largura e equipá-lo com câmeras e outros sensores para ajudá-lo a realizar operações mais complexas, acrescenta Xyu. Ele e o autor principal do estudo, Wenxiang Zhao, da Universidade de Tsinghua, detalham suas descobertas na revista Biofabrication.

Xu e seus colegas notam que as resinas que utilizaram como tinta para a bioimpressão só se tornaram estáveis em temperaturas relativamente frias. Os pesquisadores adicionaram uma solução de cloreto de cálcio para ajudar a solidificar as resinas, mas elas poderiam potencialmente danificar o corpo humano. Mas outra resina, recentemente desenvolvida independentemente por Hoelzle e seus colegas, pode solucionar esses problemas: ela pode permanecer estável em temperaturas  corporais e pode ser solidificada utilizando luz visível.

Um desafio com a bioimpressão é como efetivamente aplicar as células impressas para órgãos e tecidos frágeis existentes. Hoelzle e seus colegas testaram uma solução potencial, ao tentar “curar” furos em materiais com texturas similares — incluindo tiras de peito de frango cruas. Primeiro, o bocal da impressora extraiu um pequeno botão de tinta biológica nos furos, criando uma âncora que poderia conectar o tecido furado com uma estrutura bio-impressa. Eles então retiraram o bocal devagar, deixando para trás  uma parte do material que poderiam utilizar para colocar mais células no exterior do tecido. “Esse trabalho é esclarecedor”, diz Xu. Trabalhar nesses métodos, ele acrescenta, irá ajudar a desenvolver a bioimpressão in vivo.

Hoelzle sugere que a tecnologia talvez nunca consiga imprimir órgãos complexos. Ao invés disso, ela pode ser útil ao expandirem as aplicações de  cirurgias já usadas  com estruturas impressas relativamente modestas, capazes de liberar  medicamentos para cura ou prevenir infecções. “Existem muitas oportunidades para a engenharia de tecidos… que atualmente não são consideradas — porque ninguém gostaria de abrir o paciente para entregar o material”, diz Hoelzle.

Fonte: Sciam Brasil

Cristiane Tavolaro

Sou física, professora e pesquisadora do departamento de física da PUC-SP. Trabalho com Ensino de Física, atuando principalmente em ensino de física moderna, ótica física, acústica e novas tecnologias para o ensino de física. Sou membro fundadora do GoPEF - Grupo de Pesquisa em Ensino de Física da PUC-SP e co-autora do livro paradidático Física Moderna Experimental, editado pela Manole.

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