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Especialista em sons da natureza adverte: o mundo animal está cada vez mais silencioso

O músico americano Bernie Krause já gravou com lendas como Bob Dylan, George Harrison e Stevie Wonder. Nos últimos 47 anos, porém, dedica-se a outro tipo de música: a orquestra da natureza. Krause se especializou em bioacústica e grava os sons de animais em florestas, mares, pântanos e desertos em várias partes do mundo. Hoje, ele possui um centro de pesquisa dos sons do mundo animal, com mais de quatro mil horas de gravações e 15 mil espécies em seu habitat natural.

O trabalho de Krause tem um valor inestimável já que, à medida que florestas são desmatadas e o clima se transforma, boa parte de seu trabalho é composto de sons que não existem mais. “Tudo está mudando por causa do aquecimento global, o nível dos mares e o desmatamento em geral. Metade dos meus arquivos vêm de habitats que ou foram radicalmente transformados pela ação do homem ou já estão em silêncio. Metade desses arquivos você já não pode ouvir de outra forma”, diz. Em entrevista a GALILEU, Krause explicou por que ele acredita que o mundo natural é uma narrativa que nos conta tudo que precisamos saber. Confira:

GALILEU: Antes de se dedicar à “orquestra da natureza” você era músico. O que o fez mudar de carreira?

Eu até conheci Tom Jobim e tivemos muitas discussões sobre isso também. Eu entrei nessa área porque como um músico eu sempre trabalhava em ambientes fechados e eu queria trabalhar ao ar livre. Em 1967, desisti da música de vez e fiz minha especialização em bioacústica, o estudo do som de animais vivos, e desde então trabalho na área. O que eu descobri no ramo dos animais foi a origem da vida, algo que o Tom fez, na verdade. Boa parte de suas músicas se baseiam nos sons da Mata Atlântica que ele ouviu ao crescer no Rio de Janeiro.

Você acha que nosso conceito de música é inspirado na natureza?

Toda nossa música é inspirada pelos sons da natureza porque somos mímicos. Nós aprendemos a imitar o que ouvimos no mundo ao nosso redor. Quando vivemos mais perto do mundo natural, organizamos os sons como os animais o fazem, imitamos o som solo de animais como pássaros e mamíferos e tiramos música daí. Quando começamos, éramos uma parte pequena da orquestra animal, porque precisávamos organizar esses sons para mostrar que fazíamos parte do mesmo grupo, para sobreviver.

Você tem experiência gravando os sons da natureza brasileira?

Eu gravei os sons de muitos lugares no Brasil, como Minas Gerais, Amazônia, a Mata Atlântica, eu fui ao Brasil muitas vezes e graveis em vários locais diferentes. Meu lugar preferido é a Amazônia porque lá o som é muito mais rico. É verdadeiramente mágico. Na Mata Atlântica, o problema é que o habitat foi tão prejudicado que é muito complicado gravar lá, você simplesmente não encontra mais muita diversidade.

Estamos enfrentando um sério problema de desmatamento na Amazônia agora também. Você tem uma comparação entre os sons da Amazônia ao longo de alguns anos?

Faz muito tempo que eu não vou ao Brasil, quero voltar à Amazônia, mas ainda não consegui financiamento para isso. O que sabemos é que, ao gravar sons naturais, você pode interpretar muito rapidamente as consequências da atividade humana, e as pessoas têm muito medo disso. Muitas indústrias não querem isso, então é muito difícil de conseguir financiamento. Porque mostra muito rapidamente os resultados do desmatamento, realmente mostra o antes e o depois das atividades do homem.

“Uma foto pode valer mil palavras, mas um som vale mais que mil imagens, porque o som nos fala a verdade”

Por que usar gravadores e não câmeras para arquivar os sons da natureza?

Com uma câmera, é muito fácil enquadrar uma imagem que faz com que um habitat pareça saudável, mesmo quando ele não está. Já os microfones gravam em 360 graus, o habitat completo, e o som mostra uma perspectiva completa. O que eu falo aos meus alunos é que uma foto pode valer mil palavras, mas um som vale mais que mil imagens, porque o som nos fala a verdade, quantas espécies de pássaros, mamíferos, insetos e répteis estão ativos no lugar.

O silêncio é o som da extinção?

Nos anos 1960, uma mulher chamada Rachel Carson escreveu um livro chamado “A Primavera Silenciosa”, no qual ela explica o que vai acontecer se o mundo natural ficar silencioso por causa do homem. O que eu vejo é que estamos nos aproximando não só de uma primavera silenciosa, mas inverno, outono e verão silenciosos.

Mesmo em uma floresta densa como a da Amazônia, se você cortar apenas algumas árvores ali, as consequências serão sentidas em grande escala pelos animais que ocupam esse lugar há muito tempo. Ou seja, um efeito profundo no som que será sentido muito rapidamente. Nós temos que pensar nas formas como estamos afetando esses lugares e perguntar a nós mesmos se é isso o que queremos, o silêncio do mundo natural. São organismos vivos, essa é a vida de onde viemos, se a aniquilarmos, estaremos destruindo a vida à nossa volta. Essa é a voz divina, as pessoas falam em religiões, mas essa é a voz divina que está implorando por proteção. As nossas vidas dependem dela.

Confira, abaixo, a comparação de sons gravados por Bernie Krause em áreas que tiveram algumas áreas derrubadas:

Fonte: Revista Galileu

Cristiane Tavolaro

Sou física, professora e pesquisadora do departamento de física da PUC-SP. Trabalho com Ensino de Física, atuando principalmente em ensino de física moderna, ótica física, acústica e novas tecnologias para o ensino de física. Sou membro fundadora do GoPEF - Grupo de Pesquisa em Ensino de Física da PUC-SP e co-autora do livro paradidático Física Moderna Experimental, editado pela Manole.

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