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SUPERCAPACITORES: AS BATERIAS DO FUTURO

O grande avanço tecnológico presenciado ao longo das últimas décadas tem sido acompanhado pela contínua demanda por dispositivos que armazenam energia de forma mais eficiente e menos nociva ao meio ambiente. Frente a isto, várias companhias e institutos de pesquisa tem direcionado seus recursos ao aprimoramento de capacitores contendo eletrodos em contato direto com soluções eletrolíticas, os chamados supercapacitores [1] (Figura 1). Esse termo é utilizado para descrever capacitores eletrolíticos de dupla camada elétrica (DCE), os quais consistem em dispositivos de armazenamento e transferência de energia com alta capacitância, baixa resistência e apropriados para suprir rapidamente picos elevados de corrente quando se requer uma quantidade de energia alta em um curto intervalo de tempo. Supercapacitores são caracterizados essencialmente pela quantidade de energia acumulada por unidade de massa/volume e pela rapidez na transferência [2].

Atualmente, os supercapacitores são a fonte de energia mais promissora para aumentar a eficiência, o desempenho e a qualidade do sistema de armazenamento e suprimento de energia elétrica. Em 1897, Joseph John Thomson, utilizou um artefato experimental que, em essência, era constituído por duas placas metálicas acopladas funcionando como eletrodos positivo e negativo; tal aparato era contido no interior de um tubo de vidro cujas paredes eram recobertas de um material fluorescente, onde era aplicado uma grande diferença de potencial nos terminais dessas placas. Thomson então percebeu que o brilho que iluminava a parede oposta ao eletrodo negativo era correspondente à emissão de partículas, posteriormente nomeadas como elétrons. O mecanismo de capacitores utilizado para tal descoberta atingiam no máximo uma capacitância de 1,5 μF. No final da década de 1970, os capacitores já eram produzidos comercialmente porém ainda suportavam apenas pequenas tensões, sendo essencialmente utilizados em produtos eletrônicos. Por volta de 1971, com o avanço nas pesquisas, foi possível entender o funcionamento do dispositivo descoberto em 1957 por Howard S. Becker, os supracitados supercapacitores.

A capacidade de armazenamento de energia (capacitância), é diretamente proporcional à área do eletrodo e inversamente proporcional à distância entre as placas. Na tentativa de aumentá-la, H. Becker, além de reduzir ao limite a distância entre as placas, também encontrou meios de aumentar a área do eletrodo, para isso utilizou uma superfície porosa, derivada de carbono. Foi em 1990 que o uso dos supercapacitores passou a ser amplamente difundido, tanto na aplicação em aparelhos eletrônicos como celulares, computadores, câmeras fotográficas, quanto como “eletrodos” para implantes medicinais e em células solares, sistemas de proteção, geração de energia em localidades remotas, aparelhos de controle de potência, como fontes reserva de energia de longa confiabilidade, em regenerative-breaking. Recentemente, os supercapacitores vem sendo empregados em veículos elétricos e híbridos, nos quais geralmente são usados em conjunto com baterias e cumprem um papel como fonte complementar de energia, com o intuito de reduzir o tempo de resposta e melhorar a estabilidade e qualidade do sistema de arranque [3].

Atualmente já existem no mercado capacitores com capacitância que ultrapassam os 1000F, isso graças a invenção dos capacitores eletrolíticos. Em vista disto, diversos centros de pesquisa tem se dedicado para o estudo mais rebuscado de materiais que compõem o eletrodo, na busca do aumento da área superficial e também na redução do custo de produção, o que favoreceu o desenvolvimento e avanços na ciência dos materiais. Trabalhos prévios indicam que a densidade energética de supercapacitores construídos a partir de eletrodos porosos pode ser grandemente aumentada pelo emprego de eletrodos constituídos de nanoporos derivados de carbono, com resultados promissores sendo obtidos quando o tamanho de tais poros é comparável ao diâmetro dos íons em solução [4]. Devido à essa estrutura porosa, a área superficial é aumentada e consequentemente tem-se um aumento na capacitância. A estrutura do eletrodo é crucial para a permeabilidade do eletrólito a fim de formar a DCE. O tipo de eletrólito utilizado influencia diretamente a condutividade e voltagem máxima que pode ser alcançada. A presença de uma superfície funcionalizada e eletricamente carregada acarreta o re-arranjo de íons em sua proximidade, favorecendo assim a formação de uma estrutura difusa (DCE). A interação dos íons em solução e a superfície do eletrodo é outro ponto importante para a otimização energética de supercapacitores. Superfícies ionfóbicas, ou seja, eletrodos que mantém os íons afastados de sua superfície quando nenhuma voltagem é aplicada, mostram armazenar eficientemente mais energia como também favoreceram o melhor carregamento do capacitor. Essa repulsão (“ionfobicidade”) ou atração (“ionfilicidade”) dos íons pode ser ajustada por intermédio do revestimento da superfície dos eletrodos, com grupos funcionais ionizáveis [5].

Uma grandeza experimentalmente acessível, conhecida como capacitância diferencial, vem sendo estudada também por modelos teóricos e simulações computacionais, nos permitindo analisar propriedades da DCE e relacionar como a densidade superficial de cargas elétricas varia com o potencial eletrostático sob a superfície do eletrodo. A capacitância diferencial também pode ser afetada por efeitos íon-específicos, tais como tamanho, polarizabilidade e propensão à formação e camadas de hibratação. Consequentemente, os grupos ionizáveis na superfície do eletrodo estão sujeitos a terem suas cargas elétricas modificadas pela conjunta ação destas interações; tal efeito é conhecido por regulação de carga. Dentre as abordagens teóricas dessa grandeza, a teoria clássica de Poisson-Boltzmann se destaca por nos permitir o acesso a soluções analíticas para algumas geometrias específicas – tais como a geometria planar. Parte da simplicidade desta teoria se deve à representação do solvente como um meio inerte de constante dielétrica uniforme e por ela considerar apenas as interações eletrostáticas. No entanto, efeitos íon-específicos, por estarem relacionados ao ordenamento de moléculas de água nas proximidades das superfícies dos íons e macroíons (tais como proteínas e DNA), são ignorados pela teoria clássica de Poisson-Boltzmann. Uma forma de incorporar esses efeitos ao formalismo de Poisson-Boltzmann é por meio de potenciais não-eletrostáticos adicionais entre os íons. Nesta direção, o uso de potenciais de Yukawa íon-específicos tem se mostrado uma modelagem bem sucedida não só em descrever o alcance das interações de hidratação de forma matematicamente concisa mas também por naturalmente produzir uma estrutura semelhante à camada de Stern, ou seja, uma região próxima à superfície do eletrodo onde os íons são seletivamente depletados [6]. Como consequência, a afinidade do eletrodo por certos tipos iônicos pode ser ajustado, contribuindo assim para um armazenamento de energia mais eficiente, seguro e menos nocivo ao meio-ambiente.

Figura 1. Representação esquemática de dois eletrodos carregados positivamente imersos em uma solução aquosa contendo íons em solução. Interações ion-eletrodos levarão à formação de uma estrutura difusa onde íons negativos são atraídos para a proximidade dos eletrodos. Tal estrutura é conhecida como dupla camada elétrica e é a base para o funcionamento de supercapacitores.

REFERÊNCIAS:

[1] Béguin, F.; Presser, V.; Balducci, A.; Frackowiak, E. Carbons and electrolytes for advanced supercapacitors. Advanced materials, Wiley Online Library, v. 26, n. 14, p. 2219–2251, 2014.

[2] Salanne, M.; Rotenbeg, B.; Naoi, K.; Kaneko, K.; Ta-berna, P-L.; Grey, C.; et al. Efficient storage mechanisms for building better supercapacitors. Nature Energy, Nature Publishing Group, v. 1, n. 6, p. 16070, 2016.

[3] Conway, B. E. Electrochemical supercapacitors: scientific fundamentals and technological applications.[S.l.]: Springer Science Business Media, 2013.

[4] Vatamanu, J.; Cao, L.; Borodin, O.; Bedrov, D.; Smith, G. D. On the influence of surface topography on the electric double layer structure and differential capacitance of graphite/ionic liquid interfaces. J. Phys. Chem. Lett., ACS Publications, v. 2, n. 17, p. 2267–2272, 2011.

[5] Kondrat, S.; Kornyshev, A. A. Pressing aspring: what does it take to maximize the energy storage in nanoporous supercapacitors? Nanoscale Horizons, Royal Society of Chemistry, v. 1, n. 1, p.45–52, 2016.

[6] Brown, M. A.; Bossa, G. V.; May, S. Emergence of a stern layer from the incorporation of hydration interactions into the gouy–chapman model of the electrical double layer. Langmuir, ACS Publications, v. 31, n. 42, p.11477–11483, 2015.

Fonte: Nanocell News

Cristiane Tavolaro

Sou física, professora e pesquisadora do departamento de física da PUC-SP. Trabalho com Ensino de Física, atuando principalmente em ensino de física moderna, ótica física, acústica e novas tecnologias para o ensino de física. Sou membro fundadora do GoPEF - Grupo de Pesquisa em Ensino de Física da PUC-SP e co-autora do livro paradidático Física Moderna Experimental, editado pela Manole.

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